Professor Romero envia Artigo que aborda a temática.
O professor José Romero Araújo Cardoso, do Campus Central da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN) e do Núcleo Avançado de Educação Superior de Caraúbas (NAESC) nos enviou um excelente Artigo de sua autoria.
No texto, o Geógrafo aborda pontos referentes à defesa do Mestre Vingt-Un Rosado no tocante aos trabalhos de pesquisa acerca do petróleo na Bacia Potiguar.
Clique no link abaixo e confira o Artigo, na íntegra.
Por MAYKON OLIVEIRA
A Batalha de Vingt-un Rosado em
Defesa da Pesquisa de Petróleo na Bacia Potiguar
Por
José Romero Araújo Cardoso
Tendo concluído, em 1944, o curso de Agronomia na
conceituada Escola Superior de Agricultura de Lavras (ESAL), no Estado de Minas
Gerais, Vingt-un Rosado recebeu, no final deste ano, convocação para integrar o
esforço de guerra, em declaração formal de beligerância da ditadura Vargas
contra as forças do Eixo.
Não chegou a embarcar para a Itália, servindo no Quartel sediado
nas cidades de Ouro Fino, São João Del Rey, Três Rios e Deodoro como soldado
padioleiro de número 494. Fugas constantes em todos os finais de semana, a fim
de se encontrar com a namorada de Lavras, de nome América Fernandes, a qual se
tornou a companheira de toda existência, tornaram-se conhecidas do então
Tenente Ivan de Sousa Mendes, mais tarde General de quatro estrelas, prefeito
do Distrito Federal e Ministro do Governo José Sarney.
Prevenido pelo oficial para que ouvisse atentamente o Boletim da
Companhia, rigorosamente divulgado às 16 horas, o soldado padioleiro Vingt-un
Rosado tinha destaque na quarta parte do documento militar, sendo condenado a
15 dias de reclusão por se ausentar do Quartel sem permissão superior.
Encarcerado em um antigo armazém destinado a estocar café, não
faltou espaço e condições de equilíbrio ao apaixonado soldado para produzir
trabalho científico, pesquisar e descobrir coisas fantásticas, sobretudo
referentes à geologia potiguar. Preparou importante monografia, devida ainda da
fase discente em Lavras. Traz o título de Os Métodos de Reprodução em
Zootecnia e Suas Fórmulas Matemáticas. Devido ao comportamento exemplar,
Vingt-un Rosado só cumpriu oito dias da pena imposta pelos superiores
militares.
Era comum os alunos da Escola Superior de Agricultura de Lavras
solicitarem publicações ao Departamento Nacional de Produção Mineral. Vingt-un
Rosado as recebia regularmente. Importante estudo geológico lhe foi entregue,
no ano de 1945, por agrônomo de nome José Paulo de Matos, o qual versa,
justamente, sobre as possibilidades de fontes energéticas fossilizadas no
Brasil.
Quando de sua detenção por indisciplina militar, aproveitou para
examinar, com mais ênfase, bibliografia de geologia, organizada por Dolores
Iglesias, concentrando-se, especialmente, em dois artigos de autorias do
norte-americano Jonh Casper Branner, presidente emérito da conceituada
Universidade Stanford, Califórnia, EUA, e do mineiro Luciano Jacques de Moraes.
Até então, Vingt-un desconhecia que em profundas camadas inferiores da bacia
potiguar haviam previsto a possibilidade de existência do cobiçado ouro negro.
O trabalho de autoria de Jonh Casper Branner, publicado em
fevereiro de 1922, último de sua brilhante produção na área geológica, visto
ter falecido a primeiro de março do mesmo ano, intitula-se Possibilidade de
Petróleo no Brasil. O cientista norte-americano admitia a existência de
petróleo em Mossoró, Estado do Rio Grande do Norte, bem como na Bahia. Branner
enfatizou que dos cinco dos horizontes geológicos que produzem óleo em
outras partes do mundo, chamados Devoniano, Carbonífero, Permiano, Cretáceo e
Terciário são encontrados no Brasil (In: ROSADO, 2000, p. 114).
Quando se referiu ao período Terciário destacou que, nas formações costeiras, parece
inteiramente possível que esta zona contém petróleo onde ela se alarga para o
interior, como na Bahia, até 300 milhas, e Mossoró, no Estado do Rio Grande do
Norte (Idem; Ibid.).
A bibliografia tinha outra indicação por título Ocorrência de
Petróleo no Rio Grande do Norte, elaborado por Luciano Jacques de Moraes.
Tratava-se de um artigo publicado em “Nossa Revista”, número sete, por
solicitação dos estudantes da cidade de Ouro Preto (MG) (ROSADO, 2004,
p. 118).
Nesse trabalho, o geólogo mineiro correlaciona a existência de
petróleo no Cretáceo mexicano com as mesmas características geológicas
observadas na bacia potiguar, embora frisando que a formação petrolífera
mexicana pertence ao Cretáceo Inferior (Calcáreo do Tamasopo), enquanto a do
Rio Grande do Norte é cretáceo Superior (Turoniano) (MORAIS. In: ROSADO,
Idem, p. 122).
Além de enfatizar a Batalha da Cultura, empreendida concretamente
a partir do ano de 1948, Vingt-un Rosado tornou-se um intransigente defensor da
pesquisa petrolífera no Estado do Rio Grande do Norte e um entusiasta de sua
exploração racional, constituindo profecias de promessas futuras de geração de
emprego e renda para a população potiguar, bem como vantagens
econômico-financeiras para o Estado do Rio Grande do Norte.
Quando do regresso ao Estado do Rio Grande do Norte, Vingt-un
iniciou pesquisas sobre Louis Jacques Brunet, naturalista francês que percorreu
o País, e, em especial o Nordeste Brasileiro, explorando minas através de
comissão organizada pelo Governo Brasileiro, em meados do século XIX,
estudando, obrigatoriamente, o quadro natural da região.
Vingt-un Rosado descobriu correspondências do Padre Florêncio
Gomes de Oliveira a Brunet, na qual informava-lhe sobre prováveis ocorrências
minerais na região oeste potiguar. Fora remetida da Vila do Apodi ao
naturalista francês, aos 22 de fevereiro de 1854 (ROSADO, 2000, p. 57-58). Era
a tentativa, em vão, do mossoroense de Monte Alegre de trazer Brunet para
estudar as potencialidades minerais potiguares.
Em Extrato da Ata da Câmara de Vereadores do Apodi, datada de
agosto de 1852, Vingt-un Rosado, assessorado pelo eminente cientista Antônio
Campos e Silva, encontrou indicações frisando que:
“(...)em um dos recantos da lagoa desta vila, que está mais em
contato com as substâncias minerais da serra tem-se coalhado, em alguns anos,
uma substância betuminosa, inflamável e de boa luz, semelhante à cera em
quantidade tal que se pode carregar carros dela (Idem, p. 62)”.
ROSADO
(Idem, p. 27), frisa que:
“(...) a “substância betuminosa inflamável” referida na ata de
1852 poderia perfeitamente tratar-se de exsudação de óleo, fato não de todo
desconhecido na Chapada do Apodi. Bancos fossilíferos com o odor de “querosene”
são há muito conhecidos na região.”
O estilo era inconfundível, com certeza esse documento fora
redigido pelo Padre Florêncio Gomes de Oliveira, geólogo amador cuja obstinação
era estudar e aproveitar os recursos naturais da província norteriograndense.
Em outro extrato de Ata da mesma Câmara, datada de seis de junho de 1853, repetem-se
as mesmas preocupações socioeconômicas da anterior, primando pela mesma forma
de escrever.
O patrono de Jerônimo Vingt-un Rosado Maia na Academia
Norte-riograndense de Ciências é justamente o esforçado sacerdote. Em seu
discurso de posse, Vingt-un Rosado relacionou a quatorze ciências (Paleontologia
– Mineralogia – Geologia – Espeleologia – Geomorfologia – Climatologia –
Entomologia (A Cochonila) – Geografia – Botânica Econômica – Fitogeografia –
Fitogeografia e Zootecnia – Piscicultura – Folclore – Astronomia) o
trabalho sério e importante realizado pelo Padre Florêncio Gomes de Oliveira.
O obstinado agrônomo, de saudosa memória, com plenas preocupações
geológicas, descobriu ainda correspondência remetida da Vila do Apodi, datada
de agosto de 1853, destinada ao Sr. Antônio Francisco Pereira de Carvalho,
Presidente da província do Rio Grande, enfatizando aspectos do quadro natural
da região.
O geólogo amador mossoroense que abraçou a liturgia católica como
sacerdote, deixou escrito trabalho por título Geologia do Rio Mossoró,
datado de doze de maio de 1861, embora nunca tenha sido publicado quando de sua
conclusão. Foram remetidos exemplares ao Presidente da Província e à Sociedade
da Indústria Nacional, a qual possuía um periódico. Vingt-un Rosado pesquisou
na Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, e na Biblioteca Pública Mário de
Andrade, na capital paulista, não tendo encontrado em nenhum volume o trabalho
do Padre Florêncio Gomes de Oliveira.
O cientista Antônio Campos e Silva demonstrou que a linguagem das
Atas da Câmara de Vereadores de Apodi, nos anos de 1852 e 1853, era, de fato, a
enfatizada no estudo geológico realizado pelo Padre Florêncio Gomes de
Oliveira.
Vingt-un Rosado, a partir disso, passou a considerar o vigário
mossoroense o pioneiro número um no que tange ao registro acerca da existência
de petróleo na bacia Potiguar. Em 1894 Manoel Coriolano de Oliveira repetiu em
artigo em Almanaque no Estado do Rio Grande do Sul a constatação a que chegou o
Padre Florêncio Gomes de Oliveira (ROSADO, 2000).
Pesquisando edições antigas do jornal O Mossoroense, Vingt-un
Rosado descobriu em exemplar datado de nove de fevereiro de 1908 que o
farmacêutico Jerônimo Rosado havia constatado a existência de elaterita no
açude de Caraúbas (RN), sugerindo a utilização desse combustível fóssil para
iluminar a cidade. A elaterita é um betume elástico, enquanto fresco,
endurecendo quando exposto aos fatores exógenos (Idem).
Outra constatação de Vingt-un Rosado foi que, até 1947, nenhum
estudioso potiguar havia feito qualquer referência à possibilidade da
existência de petróleo no Rio Grande do Norte. Homens lúcidos e dotados de
extrema clarividência como Amaro Cavalcante, Tavares de Lyra, Juvenal
Lamartine, José Augusto Bezerra de Medeiros, Cristóvão Dantas, Joaquim Inácio,
Garibaldi Dantas e Manuel Dantas, de notável produção histórico-cultural e
socioeconômica, ignoraram tal hipótese.
A primeira indicação veio em artigo do médico Paulo Fernandes,
publicado por Vingt-un Rosado no jornal O Mossoroense, no mesmo ano de 1947, o
qual versava sobre petróleo e água em Mossoró, fruto de importante pesquisa
realizada pelo homem que governou a capital do oeste potiguar por menos de dois
anos, granjeando, no entanto, status de estadista.
Logo depois, Vingt-un Rosado publicou no Boletim Bibliográfico,
trabalho por título Sobre o Wildicat Mossoroense, o qual define como
sendo a zona onde se supõe existir petróleo, por dados vagos ou informações
superficiais, mas em que ainda não se provou a existência do combustível, caso
em que se teria um “Proved Land” (Idem, p. 139).
Em 1965, em tom de angústia, Vingt-un Rosado escreveu em oito de
abril que, antes desse ano, tinham sido perfurados apenas três poços de
petróleo na Bacia Potiguar. O trabalho traz o título de Um Dia as Torres
Voltarão ao Sagrado Chão de Mossoró (2004 a).
Reproduzindo Vingt-un: “Nos dias memoráveis de julho de 1960,
em que Mossoró foi cérebro e coração da Geografia Nacional, um geomorfólogo
eminente escreveu ligeiros apontamentos, inteiramente de improviso, sem
recorrer a qualquer bibliografia.
Ao final, eles vão aqui
publicados, sem consulta prévia do seu verdadeiro autor, porque o Poço
Rodrigues Alves, na Volta, em território assuano, limítrofe do de Mossoró, nas
proximidades do Trapiá, a menos de duas dezenas de quilômetros, com as suas
emanações de gases combustíveis neste ano de 1965 elevou outra vez o clamor da
gente mossoroense pela pesquisa do seu petróleo, em área há 05 anos indicada
pelo autor.
Um dia as torres voltarão ao
sagrado chão de Mossoró e dirão muito alto que John Casper Branner, o sábio de
Stanford, e Luciano Jacques de Morais, o grande geólogo patrício, estavam
certos, absolutamente certos quando há quarenta e três e trinta e nove anos,
respectivamente, falaram do petróleo mossoroense.
Santa Luzia do Mossoró,
Quinta-feira da Semana Santa, 1965”.
Até aquela data, os poços perfurados não passavam não passavam de
meia dúzia. Hoje ultrapassam cinco mil.
Eis os apontamentos de Aziz Nacib
Ab´Saber: “A bacia sedimentar costeira do Rio Grande do Norte apresenta uma
série de condições estratigráficas e estruturais de importância para pesquisa
de petróleo. Trata-se de uma bacia marginal, de tipo costeira, oriunda de uma
subsistência ponderável efetuada nos fins do mesozóico, comportando camadas
marinhas que alcançam mais de 1.000 metros na única perfuração profunda até
hoje realizada (Grossos).
A despeito da presença de dobras
epidérmicas nos estratos da bacia, ainda não foram feitos trabalhos de geologia
de campo suficientes para constatar a presença de estruturas realmente
favoráveis para sondagens possíveis. A perfuração realizada em Grossos foi de
todo infeliz em sua locação já que coincide com um ponto no eixo de uma das
modestas sinclinais da bacia. Ali em qualquer hipótese, não poderia haver
condições para o encontro de óleo, a perfuração tendo valido tão somente para
uma avaliação geral de estatigrafia local e do espessamento relativo do pacote
de sedimentos regionais. De certa forma, entretanto, resta em aberto o velho
problema das condições da bacia no que diz respeito às suas possibilidades
oleigenas.
As fotografias aéreas disponíveis
não adiantam informações concretas para a locação de estruturas favoráveis,
porém são capazes de sugerir área bem melhores que a de Grossos, ou seja, áreas
anticlinais discretas, situadas nos largos interflúvios que separam os vales
dos rios epigênicos da região.
Alguns focos de drenagem radial
existentes nos arredores de Mossoró (para SW e NW) são suficientes para sugerir
melhores pesquisas estruturais de geologia de superfície na aludida bacia, como
etapa inicial de uma nova pesquisa melhor orientada. Baseados em algumas
combinações de fatos fisiográficos e geológicos, existem duas áreas que
deveriam ser investigadas com particular atenção: a primeira, entre o baixo
Jaguaribe e o Mossoró – Apodi (Área B), junto as encostas da chamada Serra de
Mossoró; e , a segunda entre o Mossoró – Apodi e o Piranhas – Açu (Área B),
próximo a Trapiá (chapada). Tais áreas de drenagem centrífugas locais sugerem a
presença de discretas estruturas em forma de abóbada, dignas de alguns
trabalhos de geologia e de prospecção geofísica. A locação de dois novos furos
– ou pelo menos um – poderia de uma vez por todas imprimir um rumo mais seguro
às controvérsias científicas a respeito da possibilidade de ocorrência de
óleo nesta importante área sedimentar costeira do NE brasileiro. Tratando-se de
uma bacia cretácica marinha relativamente espessa, dotado de fácies marinha e
de estruturas provavelmente espessadas por subsistência técnica, além do que,
possivelmente complementada por alguma tectônica quebrável (regime de fossas),
é uma área que precisa de uma revisão bem feita no setor de suas possibilidades
oleígenas”.
Utilizamos o folheto número 64, da Série “B”, da Coleção
Mossoroense: Duas áreas na Região de Mossoró de Interesse Para as Pesquisas
de Petróleo, publicado em 1965.
A verdade é que as torres voltaram e se perguntassem a Vingt-un,
se vivo fosse, se ele teria feito uma profecia, com certeza ele responderia:
era apenas a vontade louca de que Mossoró tivesse petróleo.
A partir de 1979, os poços perfurados por classificação (Terra –
Mar) foram modificando a paisagem da Bacia Potiguar. Em 1979 foram perfurados
31 poços, crescendo acentuadamente o número destes. Em 1990 foram perfurados
212 poços. Em 1958, quando do início da prospecção petrolífera, existiam apenas
dois poços, com o da Gangorra figurando como o pioneiro. Hoje são quase 5.000
espalhados pela riquíssima bacia petrolífera potiguar (2004 a).
A batalha empreendida por Vingt-un Rosado em prol da exploração
petrolífera no Estado do Rio Grande do Norte o faz um dos precursores da luta
em defesa de nossas riquezas minerais, tantas vezes usurpadas em razão de
interesses externos que norteiam parcela significativa de nossa dependência
econômica.
Em 1979 o geólogo Francisco de Assis Melo objetivava perfurar poço
no Hotel Thermas, intuindo encontrar água para abastecê-lo, projeto enfatizado
quando do governo Tarcísio Maia. Petróleo em abundância foi jorrado, ao invés
do precioso líquido para a região semiárida. Revelou-se, no entanto, a pista
para o descobrimento do petróleo comercial (ROSADO, 2004 b). Vingt-un
Rosado fez questão, ainda, de enfatizar que Francisco de Assis Melo, um dos
eminentes geólogos do Rio Grande do Norte, foi o responsável pela descoberta do
petróleo do Hotel Thermas, economicamente explorável, no ano de 1979
(Idem).
A Revista Scientific American Brazil, edição especial número 3, de
dezembro de 2003, registra alguns nomes de pioneiros do petróleo no Brasil,
sobretudo o nome de Monteiro Lobato.
Aziz Nacib Ab´Saber publicou um trabalho sob o título: Caminhos
Transversais na Descoberta do Petróleo.
Ao publicá-lo naquele periódico, Aziz estava inscrevendo o nome de
Vingt-un na saga dos que sonhavam com a possibilidade de sua ocorrência na
Bacia Potiguar.
O leitor não pode avaliar a emoção de Vingt-un ao saber que os
royalties do petróleo mossoroense que seriam entregues à Prefeitura de Mossoró
eram superiores a dois milhões de reais em setembro de 2004.
Como se fosse num filme, ele recordou as suas pesquisas na cadeia
da Companhia Escola de Engenharia, de Ouro Fino (MG), quando encontrou John
Casper Branner (1922) e Luciano Jacques de Morais (1929).
Agora tem a palavra o maior geomorfólogo brasileiro, um dos seus
20 sábios: “Muitos episódios não pensados acontecem na vida de um pesquisador,
que, para conhecer melhor seu país, fez andanças as mais diversas. Um deles que
marcou minha vida foi a ajuda que dei a Vingt-un Rosado Maia, a fim de insistir
na necessidade de voltar a pesquisar petróleo na Bacia Potiguar.
Aconteceu que houve uma reunião da Associação dos Geógrafos
Brasileiros (AGB) em Mossoró (RN). Na época, eu ensinava geomorfologia na
UFRGS. E, devido ao conhecimento desse fato, Vingt-un se aproximou de mim para
solicitar um relatório sobre as possibilidades petrolíferas na Bacia Potiguar.
Expliquei a ele que eu, um simples professor de geomorfologia, não era geólogo
e muito menos um especialista em petróleo. “Você está escondendo o leite”, me dizia
ele.
Mas estava escrito que minha resistência iria ser vencida. Naquele
tempo, as reuniões da AGB comportavam excursões de campo e eu fui designado
para dirigir uma das equipes, desde Mossoró até a Serra de Santana, para
observações geográficas e geomorfológicas, num itinerário que repetia
parcialmente aquele feito pelo grande geólogo mineiro Luciano Jacques de
Morais.
Acontece que eu tinha vindo do Rio Grande do Sul, terra de vento
frio no inverno, para o sertão do Rio Grande do Norte, terra de forte calor e
luminosidade. Daí ter me sentido um tanto mal pelo calor excessivo durante a
viagem, desprevenido que estava em relação a qualquer bonezinho na cabeça. No
regresso a Mossoró, Vingt-un obrigou-me a uma consulta médica com um seu
parente competente, que apenas receitou uma aspirina e me liberou. No fim da
tarde, em sua casa, enquanto [ dona ] América preparava o jantar, Vingt-un
jogou um punhado de papel branco para que eu “pagasse a consulta”, auxiliando o
Rio Grande do Norte a encontrar petróleo. Não tive mais jeito de me negar,
pensando em qualquer coisa em benefício do Rio Grande do Norte. Solicitei,
porém, ao meu hospedeiro, uma carta geológica do Estado, um relatório de
Gilberto Osório de Andrade, e, se possível, o relato das perfurações prévias. Vingt-un
mandou buscar todo o material solicitado na ESAM (Escola Superior de
Agricultura de Mossoró), da qual era diretor.
Por duas horas, observei o mapa geológico e os relatórios, meditei
o que poderia escrever. E, para felicidade minha e nossa, descobri a noroeste
de Mossoró uma drenagem radial que documentava a existência de uma deformação
local semi-dômica, passível de ser considerada para perfurações novas. Fiquei
ciente de que as perfurações anteriores tinham sido feitas em lugares errados.
Dei o pequeno relatório a Vingt-un, solicitando a ele que, por uma
questão ética e profissional, não assinasse o meu nome, podendo usar meus
argumentos quando e como quisesse. E, assim foi enviado o pequeno trabalho para
Brasília, a fim de pressionar para o reinício das perfurações. “Malandramente”,
Vingt-un assinou o relatório com o nome de Antônio Natércio de Almeida (Antônio
para Aziz; Natércio para Nacib; e Almeida para Ab´Saber). A Superintendência da
Petrobras respondeu que, a despeito do aval do “grande geólogo Natércio”, não
podia voltar a pesquisar no Rio Grande do Norte, porque agora seu interesse
estava voltado para a Amazônia.
Entrementes, Vingt-un Rosado Maia não desistiu de sua idéia-chave,
e numa oportunidade de procurar água subterrânea para um grande clube de campo,
fez com que a perfuração atingisse mais do que 700 metros. E, assim, jorrou
petróleo. Daí por diante, as autoridades passaram a concentrar sua atenção
novamente na Bacia Potiguar e, em poucos anos, multiplicaram-se descobertas em
pontos específicos da Chapada norte-riograndense, e em águas semiprofundas da
plataforma continental regional, incluindo nisso o Ceará. Em certos momentos, a
Bacia Potiguar se tornou a segunda maior produtora de petróleo depois da Bacia
de Campos (RJ), ultrapassando as bacias do Recôncavo, de Alagoas, Sergipe e de
Santos. O próximo capítulo da exploração petrolífera ficaria para a distante
região da Amazônia Ocidental (Urucu e entorno).
Para completar a história do pequeno relatório de Antônio Natércio
de Almeida, devo registrar que um dia encontrei uma Xerox do mesmo nas fichas
de uma biblioteca geológica de uma faculdade do interior paulista. E soube que
um pesquisador pretensioso usou a metodologia do meu pequeno trabalho para
respaldar suas pesquisas sobre a Paulipetro, visando encontrar petróleo em São
Paulo. Não se dá conta de que tais domos fizeram com que Monteiro Lobato
dissesse que “Sempre há um diabásio no caminho da gente”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRANNER,
Jonh Casper. Possibilidade de Petróleo no Brasil. In: ROSADO,
Vingt-um. Minhas Memórias do Petróleo Mossoeroense. Mossoró/RN: Fundação
Vingt-un Rosado/Fundação Guimarães Duque, 2000 (Série C, Coleção Mossoroense,
Volume 1109)
MORAIS,
Luciano Jacques de. Ocorrência de Petróleo no Rio Grande do Norte. In:
ROSADO, Vingt-un. Minhas Memórias do Petróleo Mossoroense.
Mossoró/RN: Fundação Vingt-un Rosado/Fundação Guimarães Duque, 2000 (Série C,
Coleção Mossoroense, Volume 1109)
ROSADO,
Vingt-un. Minhas Memórias do Petróleo Mossoroense. Mossoró/RN: Fundação
Vingt-un Rosado/Fundação Guimarães Duque, 2000 (Série C, Coleção Mossoroense,
Volume 1109)
______________. Um Dia as Torres Voltarão ao Sagrado Chão de
Mossoró. Mossoró/RN: Fundação Vingt-un Rosado/Fundação Guimarães Duque,
2004 (Série B, Coleção Mossoroense, Número 2591)
______________. Um Pequeno Engano do Grande Aziz Nacib Ab´Saber.
Mossoró/RN: Fundação Vingt-un Rosado/Fundação Guimarães Duque, 2000 (Série B,
Coleção Mossoroense, Número 2596)
José Romero Araújo Cardoso. Geógrafo.
Professor-Adjunto IV do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia e
Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte. Especialista
em Geografia e Gestão Territorial e em Organização de Arquivos. Mestre em
Desenvolvimento e Meio Ambiente. Contato: romero.cardoso@gmail.com.
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